A expressão “nova evangelização” foi usada pelo Papa João Paulo II no discurso que proferiu na XIX Assembleia do Conselho Episcopal Latino-americano (CELAM), em 1983, no Haiti. João Paulo II sugeriu que as comemorações dos quinhentos anos da evangelização da América do Sul deveriam corresponder a um compromisso, não de uma reevangelização, mas de uma nova evangelização. Nova no seu ardor, nos seus métodos e nas suas expressões. “Nova evangelização” é, também, a expressão que o Papa usou, em 1994, ao refletir sobre os desafios pastorais para o novo milénio, conforme esclarece na carta apostólica Tertio Millennio Adveniente, n.º 21: “No caminho de preparação para a ocorrência do ano 2000, entra a série de Sínodos, iniciada depois do Concílio Vaticano II […]. O tema de fundo é o da evangelização, ou melhor, da nova evangelização, cujas bases foram colocadas pela Exortação Apostólica Evangelii nuntiandi de Paulo VI, publicada em 1975”. Portanto, a nova evangelização não é uma proposta para uma determinada região ou continente, mas para toda a Igreja.
No início do séc. xx, contavam-se na Europa 75% dos católicos do mundo, estando os restantes 25% distribuídos pelos outros continentes. Cerca de cem anos depois, contavam-se no velho continente apenas 20% dos católicos de todo o mundo, realidade que levou o Papa João Paulo II, em 1999, a convocar uma assembleia sinodal sobre a Igreja na Europa, afirmando, no documento que a sucedeu, a exortação apostólica pós-sinodal, que, “No continente europeu, certamente não faltam prestigiosos símbolos da presença cristã, mas, com a afirmação lenta e progressiva do secularismo, correm o risco de reduzirem-se a meros vestígios do passado” (JOÃO PAULO II, 2003, 7). “Igreja na Europa, a nova evangelização é a tarefa que te espera!” (Ibid., 45).
A 21 de setembro de 2010, o Papa Bento XVI instituiu o Conselho Pontifício para a Promoção da Nova Evangelização e, para comemorar os 50 anos do Concílio Vaticano II, com início em outubro de 2012, proclamou o Ano da Fé e convocou a Assembleia Geral do Sínodo dos Bispos, com o tema “A nova evangelização para a transmissão da fé cristã”. Das reflexões desta assembleia sinodal, o Papa não chegou a publicar nenhum documento, dado que, entretanto, renunciou ao pontificado, a 11 de fevereiro de 2013.
A expressão “nova evangelização” provocou interrogações sobre o seu significado. Para alguns, soava a uma denúncia sobre a evangelização feita no passado, pelo que se tornou necessário aprofundar a proposta de João Paulo II, baseada na Evangelii Nuntiandi de Paulo VI e depois assumida por Bento XVI. A nova evangelização não é uma rutura com o passado, mas uma nova etapa da evangelização, na qual se pede uma atitude evangelizadora com criatividade, ardor profético, linguagem e formas de comunicação adequadas para as novas gerações. O evangelho é o mesmo. A realidade humana e social é que está sempre em mudança, daí a necessidade de os cristãos se atualizarem na espiritualidade e nas propostas pastorais.
A 19 de março de 2013, o Papa Francisco assumiu o ministério pontifício e, na sua exortação apostólica Evangelii Gaudium, considerou as conclusões do então recente Sínodo dos Bispos, retomando o tema da nova evangelização como um desafio que diz respeito a todos os cristãos. Porém, desde o início da exortação, o Papa indica o encontro com Cristo como a experiência fundante de todo o dinamismo evangelizador: “A alegria do Evangelho enche o coração e a vida inteira daqueles que se encontram com Jesus” (FRANCISCO, 2013, 1), afirmando que “Cada cristão é missionário na medida em que se encontrou com o amor de Deus em Cristo Jesus” (Ibid., 120). O Papa Francisco dedica o capítulo v e último da Evangelii Gaudium ao espírito da nova evangelização. O ardor ou motivação para evangelizar acontecerá como efeito da presença do Espírito Santo no coração do cristão que se encontra com Cristo. Assim, “evangelizadores com espírito quer dizer evangelizadores que se abrem sem medo à ação do Espírito Santo” (Ibid., 259). A nova evangelização supõe o apoio da oração, uma espiritualidade que atinja o espaço interior e motive ao testemunho de vida. É no exercício de uma sã vida espiritual que o cristão se deixa transfigurar e se torna capaz de interpretar nas pessoas mais afastadas a ansiedade escondida do encontro com Deus.
Depois da primeira evangelização dos apóstolos, ao longo da história da Igreja, aconteceram, sobretudo na Europa, grandes etapas de nova evangelização. Podemos reconhecê-las em iniciativas de figuras carismáticas de relevo, como S. Bento (séc. vi), que encheu a Europa de mosteiros beneditinos, S. Francisco de Assis (séc. xiii), que testemunhou com êxito evangelizador a sua identificação com Cristo numa vida despojada e pobre, ou S.to Inácio de Loyola (séc. xvi), que, com os seus companheiros de Jesus, promoveu a evangelização pelo ensino e pela cultura. Estes, entre outros, pelo conhecimento do mundo em que viviam, pela sua experiência do encontro com Cristo e pela sabedoria do Espírito, discerniram a necessidade de testemunhar o evangelho de Cristo no seu tempo.
Desde o Concílio Vaticano II (1965), os sucessivos pontífices romanos têm exortado para a necessidade de a Igreja iluminar a realidade do mundo com a luz de Cristo e de promover a sua missão com uma nova evangelização. E foi assim que, em 2013, o Papa Francisco iniciou o seu pontificado, encorajando vivamente toda a Igreja a uma nova etapa evangelizadora, na intimidade e fidelidade a Jesus, seu Mestre e Senhor.
Bibliog.: CLEMENTE, Manuel, O Tempo Pede Uma Nova Evangelização, Prior Velho, Paulinas Editora, 2013; CONSEJO EPISCOPAL LATINOAMERICANO, Nueva Evangelización. Génesis y Líneas de Un Projecto Misionero, Bogotá, Consejo Episcopal Latinoamericano, 1990; COUTO, António, Os Desafios da Nova Evangelização, Camarate, Paulus Editora, 2014; FLORISTÁN, Casiano, Para Compreender a Evangelização, Coimbra, Gráfica de Coimbra, 1997; FRANCISCO, Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, Prior velho, Paulinas/Secretariado Geral do Episcopado, 2013; Igreja e Missão, jan.-abr. 2019; JOÃO PAULO II, Às portas do Terceiro Milénio: Carta Apostólica Tertio Millennio Adveniente do Sumo Pontífice João Paulo II ao Episcopado, ao Clero e aos Fiéis sobre a Preparação para o Jubileu do Ano 2000, Lisboa, Secretariado Geral do Episcopado/ Editora Rei dos Livros, 1994; Id., Exortação Apostólica Pós-Sinodal Ecclesia in Europa, 3.ª ed., Prior Velho, Paulinas Editora/Secretariado Geral do Episcopado, 2003; SEBASTIÀN, Fernando, Evangelizar, Madrid, Ediciones Encuentro, S.A, 2010.
José Traquina