As dimensões temporal e causal do mundo reúnem-se sob a forma de acontecimento, cujo estatuto ontológico é amplamente discutido. A distinção entre o que sucede sob a figura de acontecimentos, causados uns pelos outros, e o que acontece como ato, originado por um agente, é acompanhada por uma miríade de perspetivações apontando para oposições e conexões diversas. No contraste com os objetos, diz-se que estes “existem”, enquanto os acontecimentos “ocorrem”, atribuindo à existência e à ocorrência densidades ontológicas diferentes. Tal diferença é, entretanto, negada na consideração de uma mera dissemelhança temporal: os objetos perduram no tempo, os acontecimentos são pontuais. Já em contraste com os factos, a diferenciação é colocada na respetiva atemporalidade, ainda que se unam factos e acontecimentos na consideração de que a cada acontecimento está ligado um facto. Por sua vez, a conjugação entre acontecimento e ação é intentada por via da conceptualização de “acontecimento mental”: atitudes psicológicas, como sejam as crenças, causam acontecimentos descritos como ações. A tal intento opõe-se a diferenciação entre uma “ontologia da pessoa” e uma “ontologia do acontecimento”. Como algo imprevisto, o acontecimento é conexo quer com o livre-arbítrio quer com limites da razão, convidando, em ambos os casos, à interpretação.
Bibliog.: impressa: DAVIDSON, Donald, Essays on Actions and Events, Oxford, Clarendon Press, 1980; RICOEUR, Paul, Soi-même comme un Autre, Paris, Éd. Seuil, 1990; digital: CASATI, Roberto e ACHILLE, Varzi, “Events”, in ZALTA, Edward N. (ed.), The Stanford Encyclopedia of Philosophy (Summer 2020 Edition): https://plato.stanford.edu/archives/sum2020/entries/events/.
Ana Leonor Morais dos Santos