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Água

Em hebraico maym e em grego hydôr, este elemento cósmico aparece 664 vezes na Bíblia, porque é algo essencial a toda a espécie de vida e escasseava no ambiente geográfico do povo da Bíblia. Outro valor e sentido fundamental da água é o da purificação, não apenas do corpo, mas também de qualquer objeto ou espaço: lavamos apenas com água. Estes dois eixos de sentido “utilitário” serviram como ponto de apoio e de partida para outros valores semânticos. Assim, a água, quando é profunda, pode ter um valor negativo de afogamento e morte. É o que se diz do Dilúvio em Génesis 6-8 e noutros textos de afogamentos no “mar” (thalassa, por exemplo, em Mc 8, 32). No Apocalipse aparece por seis vezes a água (hydôr) como meio de inundações diluvianas (1, 15; 12, 15; 14, 2; 17, 1.15; 19, 6). Por isso, só Jesus, Senhor do mar que criou (Jo 1, 3), pode caminhar sobre as águas do mar (Mt 14, 22-33; Mc 6, 45-52; Lc 9, 10-17; Jo 6, 16-21).

 

Sentido espiritual

Este significado negativo, de morte, levou, simbolicamente, à descoberta de um sentido positivo, quando se trata de “afogar” o homem velho, na piscina batismal. O verbo baptizô significa precisamente “mergulhar” na água para purificar do pecado e para matar o homem velho, a fim de surgir, com a fórmula batismal em nome de Cristo, o homem completamente novo (Rm 6, 1-11; Gl 3, 27). O sentido de purificação interior, como preparação para a vinda do Messias, deu origem a diferentes rituais de batismo entre os judeus, o mais conhecido dos quais foi o de João Batista. Havia ainda outros rituais da água com este mesmo simbolismo de purificação interior, como era o de Qumrân.

Já no Antigo Testamento aparece este simbolismo da vida, vida plena, por exemplo, no belíssimo texto de Ezequiel 47, 1s, no qual a água, precisamente porque sai do lado do altar (símbolo de Deus), vai aumentando cada vez mais, semeando vida através do deserto (da morte), até descer às águas do Mar Morto e transformá-lo em Mar de vida, portanto, Deus como fonte de vida plena e total.

O tema de Deus como vida e fonte de vida, mediante o simbolismo da água, é agora revelado na pessoa de Jesus à mulher samaritana: “Todo aquele que bebe desta água voltará a ter sede;  mas, quem beber da água que eu lhe der, nunca mais terá sede: a água que eu lhe der há de tornar-se nele em fonte de água que dá a vida eterna” (Jo 4).

O mesmo dirá Jesus precisamente numa procissão da água em Jerusalém: “No último dia, o mais solene da festa, Jesus, de pé, bradou: ‘Se alguém tem sede, venha a mim; e quem crê em mim que sacie a sua sede! Como diz a Escritura, hão de correr do seu coração rios de água viva’. Ora Ele disse isto, referindo-se ao Espírito que iam receber os que nele acreditassem; com efeito, ainda não tinham o Espírito, porque Jesus ainda não tinha sido glorificado” (Jo 7, 37-39). Jesus profetiza nestas palavras o mais íntimo da sua vida – o Espírito – como último dom de si próprio à humanidade, ao deixar sair sangue e água – os símbolos mais importantes da vida – do seu lado trespassado pela lança: “Um dos soldados traspassou-lhe o peito com uma lança e logo brotou sangue e água. Aquele que viu estas coisas é que dá testemunho delas e o seu testemunho é verdadeiro” (Jo 19, 34-35). Agora ficamos a saber que a verdadeira água da vida sai do coração de Jesus. De nenhum outro, como se poderia pensar do referido texto de Jo 7, 37-39.

 

Bibliog.: KITTEL, Gerard, Theological Dictionary of the Old Testament, vol. 8, Grand Rapids-MI, W. M. B. Eerdmans Publishing Company, 1993, pp. 314-333; BALS, Horst e SCHNEIDER, Gerhard, Diccionario Exegético del Nuevo Testamento, vol. 1, col. 334; vol. 2, col. 1820-1823; Dictionnaire Encyclopédique de la Bible, Brépols, 1987, pp. 368-369; ALVES, Herculano, 50 Símbolos na Bíblia, 3.ª ed., Difusora Bíblica, Fátima, 2017, pp. 19-30.

Herculano Alves


Água

A vida no planeta Terra, tal como a conhecemos, é indissociável da água. Água é vida e símbolo de vida, é fonte de desenvolvimento; o acesso à água é fruto e expressão da justiça e da equidade social, contribuindo para a redução da pobreza e para o desenvolvimento sustentável, pois sem ela não é possível sobreviver, não é possível crescer. Pela importância inegável que representa para a humanidade, o acesso à água potável e ao saneamento básico constitui o objetivo 6 da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável.

A água constitui um recurso insubstituível na quase totalidade das atividades humanas e no ambiente. A dinâmica da sua circulação e a aleatoriedade da sua ocorrência impõem regras práticas de gestão que conduzem necessariamente a uma abordagem integrada territorialmente no espaço físico da bacia hidrográfica ou do aquífero. As suas múltiplas aplicações, por vezes até responsáveis por conflitos, obrigam a uma interação no espaço das utilizações, levando a compatibilizar as lógicas e as dinâmicas próprias de cada sector e a dar coerência à ação das diversas entidades que participam, direta ou indiretamente, no planeamento, gestão e utilização dos recursos hídricos.

As intervenções a empreender no domínio hídrico não podem limitar-se a encarar as linhas de água, as albufeiras ou os aquíferos como meras fontes de captação ou locais de rejeição. É necessário atender aos múltiplos valores ambientais e patrimoniais dos meios hídricos, nomeadamente ao seu destacado papel na conservação dos ecossistemas.

A gestão dos recursos hídricos é tanto um problema público como um campo de luta onde se enfrentam interesses divergentes. Não chega ver a água como “o sangue do nosso planeta”, ainda é preciso ponderar e verificar se o direito à vida, à vida dos homens e da natureza, é ou não é garantido pelas decisões dos homens. Devemos encarar o ambiente como uma responsabilidade social e como um fator estratégico de sustentabilidade.

A questão da água interpela a humanidade no plano ético, no plano político, no plano da justiça e da solidariedade. Nenhuma outra questão merece mais atenção por parte da humanidade, pois ela determina a paz universal e o futuro de todos os seres vivos; deste modo, só um olhar global e ético sobre os recursos hídricos permitirá compreender a sua importância excecional para a permanência da vida humana na Terra.

Esta consciência, hoje praticamente universal, deu início a um processo de mudança que a atual geração tem o dever de seguir, para benefício próprio e das futuras gerações. É por isso urgente desenvolver uma ética comum contra a crescente escassez e vulnerabilidade da água, ética fundamental para a capacidade que os homens têm para sobrepor ao egoísmo do privilégio a consciência da responsabilidade coletiva das gerações futuras. Esta ética proporcionará a formação de uma humanidade consciente perante a vida na Terra e dará origem a um novo comportamento com preocupações na preservação global da natureza, tornando-se assim numa nova esperança para a vida humana no planeta.

Bibliog.: impressa: AGÊNCIA PORTUGUESA DO AMBIENTE, Programa Nacional para o Uso Eficiente da Água, Lisboa, Ministério da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do território, 2012; ARAÚJO, J., et al., “A ética e a água”, in MALCATA, F. Xavier, Água: um Desafio sem Espaço nem Tempo, Lisboa, Universidade Católica Editora, 2009; CALLAHAN, Daniel, The Five Horsemen of the Modern World, New York, Columbia University Press, 2016; digital: UNESCO, UN, United Nations World Water Development Report 2020: Water and Climate Change, https://www.unwater.org/publications/world-water-development-report-2020/; UNITED NATIONS, Transforming our World: The 2030 Agenda for Sustainable Development, A/RES/70/1 (acedido a 21.12.2020); https://www.un.org/en/development/desa/population/migration/generalassembly/docs/globalcompact/A_RES_70_1_E.pdf (acedido a 21.12.2020).

Joana Araújo

Autores

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