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Ciclotimia

A variabilidade do humor dos indivíduos é alvo de fascínio e perplexidade desde as primeiras sociedades humanas, relacionando assim perturbações de humor, como a ciclotimia, com a espiritualidade. Por um lado, o êxtase ou a euforia são, desde há milénios, formas essenciais para líderes religiosos conseguirem atingir a conexão com um ser superior. Exemplo disso, na Grécia antiga, é o êxtase do oráculo de Delfos, que permitia a previsão do futuro e o contacto com os deuses, sendo de tal forma respeitado, que as mais altas figuras da sociedade helénica o procuravam para tomar decisões importantes. Por outro, relatos de humor depressivo têm sido descritos em místicos cristãos, com Henri Delacroix a caracterizar de forma pormenorizada como as descrições místicas destes profetas se relacionam com sintomas depressivos ou mesmo sintomas sugestivos de perturbação bipolar. Deste modo, fenómenos psicopatológicos poderão ter contribuído para a conexão espiritual do ser humano com as suas crenças religiosas e místicas, tendo apenas mais tarde, com o desenvolvimento do conhecimento científico, surgido as primeiras definições destas patologias.

O termo “ciclotimia” foi cunhado pela primeira vez em 1882, por Ludwig Kahlbaum, psiquiatra alemão, que a caracterizou como uma psicose cíclica que afeta o humor sem que, porém, haja deterioração cognitiva. Segundo o autor, esta condição leva a uma disfunção da vida dos pacientes, no entanto sem que a maioria destes fosse internada em asilos psiquiátricos. Esta foi a protodefinição que, após mais investigações sobre esta patologia, deu origem a outros critérios que com o passar das décadas se foram aprimorando. Atualmente, segundo a última versão do Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2013), a perturbação ciclotímica caracteriza-se por uma alteração de humor crónica em que há variação entre períodos com sintomas hipomaníacos e períodos com sintomas depressivos, sendo que nenhum deles tem severidade ou duração suficiente para cumprir os critérios de diagnóstico suficientes para um episódio hipomaníaco ou um episódio depressivo major. Além disso, é necessário que este padrão esteja presente por pelo menos dois anos e que não haja um período de mais de dois meses sem sintomas. Apesar de estes sintomas não cumprirem os critérios de diagnóstico para outras perturbações, a perturbação ciclotímica leva a um elevado nível de stress ou disfunção social e profissional, sendo este um critério de diagnóstico indispensável para esta perturbação.

 

Bibliog.: ÁLVAREZ RODRÍGUEZ, Francisco Javier, Mística y Depresión: San Juan de la Cruz, Madrid, Editorial Trotta, 1997; AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders, Arlington, American Psychiatric Association, 2013; KOUKOPOULOs, Athanasios, “Ewald Hecker’s description of cyclothymia as a cyclical mood disorder: Its relevance to the modern concept of bipolar II”, Journal of Affective Disorders, n.º 73, 2003, pp. 199-205.

 

Pedro Guilherme Alves Dias

Autor

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