O conceito de descrição ocupou um importante lugar na filosofia da linguagem no séc. xx, focada no estudo das estruturas lógicas da linguagem e na gramática dos conceitos. Distinguem-se, habitualmente, dois tipos de descrições: as descrições definidas e as descrições indefinidas.
Bertrand Russell elaborou uma teoria das descrições definidas, que considerava serem fundamentais na compreensão da linguagem, com implicações epistemológicas e metafísicas. A discussão em torno das diferenças entre as descrições definidas e as descrições indefinidas permanece no centro da filosofia analítica. Genericamente, uma descrição definida é uma frase da forma “o F”, enquanto uma descrição indefinida terá a forma “um F”. Vários filósofos, incluindo Russell, trataram os nomes próprios também como descrições definidas. Esta abordagem, contudo, é ainda simplista, já que expressões com esta forma podem não ser exatamente descrições – e.g., na frase “o João é um advogado”, pode argumentar-se que “um advogado” não é uma descrição em sentido próprio, mas antes parte do predicado – e também porque expressões com formas diferentes podem considerar-se descrições – e.g., pronomes (possessivos: e.g., a expressão “o meu pai” é uma descrição, porque quer dizer “o pai de eu”, ou pessoais e relativos: e.g., em “Um homem entrou na casa. Ele traz uma espada”, “ele” refere “o homem que entrou na sala”).
Segundo Russell, uma descrição definida inclui sempre uma afirmação de existência, uma afirmação de unicidade e uma afirmação de maximalidade. Assim, a descrição definida “O F é G” é uma maneira abreviada de dizer a conjunção de “Existe um F”, “Tudo o que é F é G” e “Existe, no máximo, um F”. Um dos mais famosos exemplos mencionados por Russell é a questão do valor de verdade da frase “o atual rei de França é careca”. Em primeira instância, a frase parece falsa porque, de entre os objetos carecas, não se conta o atual rei de França, porque não existe um atual rei de França. Assim sendo, se esta frase é falsa, a sua negação devia ser verdadeira – o que não faz sentido, já que, precisamente, não existe um atual rei de França. Ora, se, como afirma Russell, uma descrição definida não for uma expressão referencial, mas incluir a conjunção de três expressões do tipo das indicadas acima, o valor de verdade da negação de “o atual rei de França é careca” dependerá do sentido que se der à frase – se se disser “não existe um x tal que x seja o atual rei de França e que seja careca”, a frase é verdadeira, porque de facto não existe tal ser; se se disser “existe um x tal que x é o atual rei de França, e o x que é o atual rei de frança não é careca”, a frase é falsa. Assim, o valor de verdade depende da forma lógica, não se violando nenhum princípio.
As críticas à teoria de Russell costumam dividir-se em objeções à forma como as descrições definidas são analisadas, em objeções à forma como são tratados os nomes próprios e em argumentos em relação ao problema das descrições incompletas. P. F. Strawson e Saul Kripke contam-se entre os principais críticos da sua teoria.
O conceito de descrição distingue-se do de explicação, embora estejam relacionados. Enquanto uma descrição diz como é um objeto, uma explicação procura dar os princípios, as razões e/ou as causas que fazem esse objeto ser como é. Explica-se um conceito ou objeto de conhecimento evidenciando como ele pode ser deduzido de verdades previamente estabelecidas ou de princípios evidentes.
Fora do contexto estrito da filosofia da linguagem, a noção de descrição continua a ter aplicação, independentemente da teoria das descrições definida, nomeadamente na filosofia da ação (e consequentemente na ética), pela mão de G. E. M. Anscombe, que mostrou como falar de uma ação é sempre falar de uma ação sob uma determinada descrição, que a mesma ação pode ter várias descrições e que uma mesma ação pode ser intencional sob uma descrição e não intencional sob outra.
Bibliog.: impressa: HYLTON, Peter, “The Theory of Descriptions”, in GRIFFIN, Nicholas (ed.), The Cambridge Companion to Bertrand Russell, Cambridge, Cambridge University Press, 2003, pp. 202-240; RUSSELL, Bertrand, “On denoting”, Mind, vol. 14, 1905, pp 479-493; Id., “Knowledge by acquaintance and knowledge by description”, Proceedings of the Aristotelean Society, new series, vol. 11, pp. 108-128; digital: ANSCOMBE, Gertrude Elizabeth Margaret, “Under a description”, Noûs, vol. 13, n.º 2, 1979, pp. 219-233: https://www.jstor.org/stable/2214398 (acedido a 30.12.2020); LUDLOW, Peter, “Descriptions”, in ZALTA, Edward N. (ed.), The Stanford Encyclopedia of Philosophy, fall 2018 edition: https://plato.stanford.edu/archives/fall2018/entries/descriptions (acedido a 30.12.2020).
Joana Corrêa Monteiro