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Filho do Homem

“Filho do Homem” é uma expressão tipicamente semita (em hebraico, ben-’adam; em aramaico, bar-’enash; em grego, huiós tou anthropou) e significa simplesmente “Homem”, um ser da raça humana, “filho da humanidade”, portanto de condição mortal (Sl 8, 5). A expressão surge 183 vezes na Bíblia, a maior parte delas no Novo Testamento, sobretudo nos evangelhos e referindo-se a Jesus, com sentido especial (Ez, várias vezes; Dn 7, 13; 8, 17; Sl 80, 18).

Em Daniel e Ezequiel, a expressão surge em contexto apocalíptico: os impérios inimigos do povo de Deus vão cair e um Filho do homem celestial recebe a realeza, diante do tribunal de Deus, que julga tais impérios, simbolicamente apresentados como bestas/animais: “O tribunal reuniu-se em sessão e foram abertos os livros.  Eu olhava. Por causa do ruído das palavras arrogantes que o chifre proferia, esse animal foi morto e o seu corpo desfeito e atirado às chamas do fogo. Quanto aos outros animais, também lhes foi tirado o poderio; no entanto, a duração da sua vida foi-lhes fixada a um tempo e uma data. Contemplando sempre a visão nocturna, vi aproximar-se, sobre as nuvens do céu, um ser semelhante a um filho de homem. Avançou até ao Ancião, diante do qual o conduziram. Foram-lhe dadas as soberanias, a glória e a realeza. Todos os povos, todas as nações e as gentes de todas as línguas o serviram. O seu império é um império eterno que não passará jamais, e o seu reino nunca será destruído” (Dn 7, 10-14). Agora, a realeza é atribuída por Deus ao povo de Israel, antes perseguido pelos impérios vizinhos. É sobretudo deste texto apocalíptico que parte todo o significado que esta expressão irá adquirir nos evangelhos.

Nos evangelhos, a expressão encontra-se apenas na boca de Jesus, que se atribui a si mesmo este título (Mt 8, 20; 11, 19; 16, 13; Jo 3, 13ss; 12, 34). Jesus empregou esta expressão por ela ter um duplo sentido: por um lado, podia ser interpretarada no sentido mais banal de simples “homem”; por outro, estava carregada do simbolismo apocalíptico do Antigo Testamento. Jesus deixou essa ambiguidade em aberto até à hora definitiva em que tinha de definir a sua identidade, perante o sumo sacerdote, no julgamento, antes da Paixão: “O Sumo Sacerdote voltou a interrogá-lo: ‘És Tu o Messias, o Filho do Deus Bendito?’ Jesus respondeu: ‘Eu sou. E vereis o Filho do Homem sentado à direita do Poder e vir sobre as nuvens do céu’. O Sumo Sacerdote rasgou, então, as suas vestes e disse: ‘Que necessidade temos ainda de testemunhas? Ouvistes a blasfémia! Que vos parece?’. E todos sentenciavam que Ele era réu de morte” (Mc 14, 61-64). É curioso notar aqui que Jesus aceita ser duas coisas: o “Messias” prometido pelos profetas e o “Filho do Deus Bendito”, acrescentando ainda uma outra faceta importante da sua personalidade divina: “E vereis o Filho do Homem sentado à direita do Poder e vir sobre as nuvens do céu”, aludindo claramente à profecia de Daniel. É por este título divino que Ele define claramente o seu messianismo, que não tem a ver com o messias daívico, mas com o papel que desempenha como messias celeste, tendo sido certamente estes três motivos que lavraram a sua sentença de morte. Contudo, há outros textos em que Jesus declara ser o Filho do Homem da profecia (Mt 16, 27; 19, 28; 24, 30).

 

Bibliog.: HAAG, H., “Ben ’adam”, in BOTTERWECK, G. Johannes e RINGGREN, Helmer (coords.), Theological Dictionary of the Old Testament, vol. 2, Grand Rapids, William B. Eerdmans Publishing Company, 1993, pp. 159-165; LÉON-DUFOUR, Xavier, Vocabulaire de Théologie Biblique, Paris, Ed. du Cerf, 1964; MICHEL, O., “Hijo del Hombre/Hyiós tou Anthropou”, in COENEN, Lothar et al. (coords.), Diccionário Teológico del Nuevo Testamento, vol. 1, 5.ª ed., Salamanca, Ed. Sígueme, 2003, pp. 668-680.

 

Herculano Alves

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