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Fonologia

Derivando etimologicamente do grego phonos (“voz”/“som”) e logos (“palavra”/”estudo”), o termo “fonologia” designa uma disciplina linguística que tem como objeto os sistemas de sons das línguas. Enquanto a fonética se dedica à descrição das propriedades físicas e articulatórias dos sons, a fonologia aborda a estrutura abstrata dos sons da fala, estudando os fonemas, i.e., as unidades abstratas que se materializam nos sons da fala (SILVA, 2010, 112). Fonologia e fonética privilegiam, desta forma, duas perspetivas complementares de análise dos sons das línguas.

Apesar de as primeiras ocorrências do termo terem surgido entre o final do séc. xviii e inícios do séc. xix, este não era utilizado com a atual aceção. Exemplo disso é o capítulo “Principes de phonologie”, do Cours de Linguistique Générale de Saussure, no qual são apresentadas descrições e análises fonéticas, não sendo privilegiada a atual perspetiva fonológica. A obra Essai de Phonétique et de Phonologie de la Langue Portuguaise d’aprés le Dialecte de Lisbonne (1883), de Aniceto dos Reis e Gonçalves Viana, constitui a primeira publicação de autoria portuguesa que atesta a adoção de uma perspetiva fonológica. A atual distinção entre fonética e fonologia só viria a surgir nos anos 30 do séc. xx, com os trabalhos do Círculo de Praga e do Estruturalismo americano. Leonard Bloomfield (1933, 76-77) definia a fonologia como “o estudo dos significantes do discurso”. Já no âmbito do Círculo de Praga, Nicolau Trubetzkoi definia a fonética como “ciência da face material dos sons da linguagem humana”, referindo que a fonologia, por seu lado, “deve procurar que diferenças fónicas estão ligadas, na língua estudada, a diferenças de significação” (TRUBETZKOI, 1949, 12). No âmbito do Estruturalismo europeu, em 1960 surge a obra Éléments de Linguistique Générale, de André Martinet, tendo sido traduzida para o português por Jorge Morais de Barbosa. Em 1968, surge a publicação The Sound of Pattern of English (SPE), de Noam Chomsky e Morris Halle, obra que viria a servir de referência à atualmente designada fonologia generativa clássica. Baseando-se neste modelo, em 1975 Maria Helena Mira Mateus publicou a obra Aspetos Fonológicos do Português, e, em 1977, Ernesto d’Andrade Pardal publicou Phonologie (Générative) du Portugais. Após a aplicação do modelo SPE em diferentes línguas, nas últimas décadas do séc. xx desenvolveram-se novas orientações no âmbito da fonologia, nomeadamente a fonologia autossegmental e a geometria de traços. Por outro lado, o desenvolvimento da prosódia e a análise dos traços prosódicos – o tom, a duração, a intensidade – vieram possibilitar análises fonológicas cada vez mais aprofundadas.

No âmbito da espiritualidade e da mística, refira-se o célebre exemplo de Panini, gramático indiano que viveu no séc. v a.C. e desenvolveu uma teoria fonética e fonológica do sânscrito por motivações religiosas e místicas: o sânscrito era entendido como a língua dos deuses, e qualquer imprecisão de pronúncia e articulação dos sons das formas rituais poderia invalidar o valor das cerimónias hindus (BURROW, 2001, 47). Esta preocupação com a preservação da pronúncia e articulação dos sons das palavras tem vindo a ser retomada ao longo dos séculos, sendo inerente a diferentes tipos de rituais místicos e religiosos.

 

Bibliog.: BARBOSA, Jorge de Morais, Elementos de Linguística Geral, Lisboa, Sá da Costa, 1964; BLOOMFIELD, Leonard, Language, New York, Holt, Rinehart & Winston, 1933; BURROW, Thomas, The Sanskrit Language, Delhi, Motilal Banarsidass Publishers, 2001; CHOMSKY, Noam e MORRIS, Halle, The Sound Pattern of English, New York, Harper and Row, 1968; FARIA, Isabel Hub et al. (org.), Introdução à Linguística Geral e Portuguesa, Lisboa, Caminho, 1996; MARTINET, André, Économie des Changements Phonétiques – Traité de Phonologie Diachronique, Berne, Francke, 1955; Id., Éléments de Linguistique Générale, Paris, Armand Colin, 1960; MATEUS, Maria Helena Mira, Aspetos Fonológicos do Português, Lisboa, Centro de Estudos Filológicos, Lisboa, 1975; MATEUS, Maria Helena Mira et al., Fonética e Fonologia do Português, Lisboa, Universidade Aberta, 2005; OLIVEIRA, Fernão de, Grammatica da Lingoagem Portugueza, Lisboa, 1536; PARDAL, Ernesto d’Andrade, Phonologie (Générative) du Portugais, Lisboa, Centro de Linguística da Universidade de Lisboa, INIC, 1977; SAUSSURE, Ferdinand, Cours de Linguistique Générale, França, Payot, 1995; SILVA, Paulo Nunes da, Manual de Introdução aos Estudos Linguísticos, Lisboa, Universidade Aberta, 2010; TRUBETZKOI, Nicolas, Principes de Phonologie, Paris, Klincksieck, 1949.

 

Rute Rosa

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