O nome Mateus é conhecido na tradição bíblica principalmente a partir de duas fontes: primeiro, aparece nas páginas dos Evangelhos como o nome de um dos 12 apóstolos escolhidos para seguir Jesus. O que estas páginas nos dão a ler a seu respeito é pouco: como personagem, surge na cobrança de impostos (Mt 9, 9), pelo que é comummente associado aos publicanos, cobradores de impostos que prestavam serviço ao Império Romano (que controlava politicamente a Palestina daqueles dias). Esta função, pelo apoio direto ao controlo imperial e à consequente manutenção do domínio estrangeiro, era motivo para que a classe fosse malquista da sociedade judaica. Entende-se, a partir dessas colocações, que Jesus escolheu, para o acompanhar, um sujeito comum e de má reputação pública, o que mostra a novidade do seu movimento, que, como se sabe, privilegiava os indivíduos marginais que os representantes das religiões predominantes desprezavam.
Esse Mateus, aliás, é caracterizado no mesmo Evangelho como um seguidor exemplar; a sua reputação é exaltada de maneira indireta pela prontidão com que atende ao chamamento de Jesus na narrativa. A sua reação decidida e imediata faz lembrar o modo como os apóstolos Pedro, André, Tiago e João haviam respondido ao mesmo convite em passagens precedentes. Quando convocados pelo Mestre, logo deixaram tudo para o seguir; o narrador bíblico não menciona a respeito desse evento qualquer sinal de hesitação (Mt 4, 18-22), pelo que supomos, a partir da análise comparativa das narrativas, que Mateus também assume com méritos o seu lugar entre os 12. E vale a pena referir que, em oposição a estes, temos no mesmo Evangelho exemplos negativos de pretendentes hesitantes: quando têm aberta diante de si a oportunidade de seguir Jesus e aderir ao seu movimento, dividem-se entre o desejo de ser parte do grupo itinerante e o cuidado das preocupações próprias da vida terrena (Mt 8, 19-22; 19, 16-22), com o resultado aparente do fracasso.
A segunda fonte bíblica que nos coloca diante do nome Mateus é de carácter paratextual, pois expressa-se no título que se dá ao primeiro evangelho. Sabemos que a tradição cristã estabeleceu a ligação entre o primeiro evangelho e o nome de Mateus desde cedo, de modo que personagens importantes, como Pápias, Irineu, Orígenes e Eusébio, escrevendo antes do concílio que estabeleceu o cânone cristão no final do séc. iv, estão entre aqueles que acreditavam que o apóstolo de Jesus havia escrito o Evangelho. Estabelecida a Tradição, tornou-se cada vez mais habitual a cópia ou a impressão de Bíblias que apresentavam o primeiro Evangelho como obra escrita “segundo Mateus”. O texto bíblico, entretanto, não fornece qualquer indício de que o apóstolo de Jesus chamado Mateus possa ter sido o autor do Evangelho; aliás, essa é uma posição que, na contemporaneidade, tem pouca aceitação por parte dos especialistas.
Bibliog.: HORSLEY, Richard A., Jesus e a espiral da violência: Resistência judaica popular na Palestina romana, São Paulo, Paulus, 2010; KOESTER, Helmut, Introdução ao Novo Testamento, vol. 2: História e literatura do cristianismo primitivo, São Paulo, Paulus, 2005; MARCONCINI, Benito, Os Evangelhos Sinóticos: Formação, redação, teologia, São Paulo, Paulinas, 2001.
Anderson de Oliveira Lima