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Lallemant, Louis

Louis Lallemant (1588-1635) entrou para a Companhia de Jesus em 1605, tendo ocupado diversos cargos de ensino e de direção, em particular no âmbito do terceiro ano de noviciado, em Rouen, de 1628-1631. Foi aí que acompanhou a formação de Jean de Brébeuf, Isaac Jogues, Julien Maunoir e Jean Rigoleuc, todos eles protagonistas na Bretanha e na Nova França (objetivo para o qual Lallemant se tinha voluntariado), espaços missionários que era importante manter. Foi aí também que concebeu a substância da sua obra espiritual, que não foi, contudo, por si realizada. Não se trata, pois, de uma obra concebida pelo próprio Lallemant. As suas conferências de direção foram reproduzidas por um dos seus alunos acima referidos, Jean Rigoleuc, e resumidas na margem por Jean-Joseph Surin, bem conhecido pelo papel que desempenhará no tema da possessão de Loudun e pela sua vasta correspondência, publicada por Michel de Certeau em 1966. Um outro jesuíta, Champion de La Mahère, descobre em 1694 as notas das conferências do padre Rigoleuc e fá-las publicar pela primeira vez, depois de as ter dividido em sete doutrinas. Alguns dos seus tratados (como De la Garde du Cœur), que tinham sido antes falsamente atribuídos ao padre Rigoleuc, foram restituídos a Lallemant. Como demonstrou Dominique Salin, as conferências de Lallemant foram, com efeito, não raro, literalmente copiadas por Rigoleuc e não reescritas, como se pensou durante muito tempo. O interesse destas peripécias editoriais está em que nos mostram uma certa instabilidade dos escritos jesuítas deste período, cujos autores constituem e pretendem ser uma “comunidade”, e isto, tanto mais, talvez, que a sua primeira inspiração é o autor de uma outra obra espiritual não escrita, Inácio de Loyola, fundador da Companhia de Jesus, de que todos estes autores são especialmente “filhos”. De um modo geral, os escritos herdados do ensino de Lallemant revelam a insistência numa orientação mais “mística” do que “ascética”, em que o acesso à contemplação, definida como uma “segunda conversão”, representa o centro. Esta “segunda conversão” é certamente uma chave para a compreensão da “doutrina espiritual” de Lallemant, se, contudo, esta doutrina for entendida como uma forma de ensino ou de instrução, muito particularmente no quadro do terceiro ano, que ele teve a seu cargo de 1619 a 1631: ela significa, de facto, o que o jesuíta entende por “guarda do coração”, neste momento da vida espiritual em que o destino de uma vida ativa se deve fundar, ou mesmo refundar-se, se necessário (sabemos por Certeau a crise que atravessa a Companhia no início do séc. xvii, quando a articulação entre o “interior” e o “exterior” se rompe), numa vida em Cristo. É dela, na “pureza de coração mais do que no exercício das virtudes”, que deve chegar o momento em que, como afirma uma testemunha do final da sua vida, “ele sentia Deus agir (sentire se agit Deum)”. Como escreve Lallemant, “pela graça santificante, Deus faz para si uma cidadela na alma, onde se esconde. Pela sua paz, Ele como que faz uma saída e apodera-se de todas as faculdades […]. Assim, os santos estão unidos a Deus tanto na ação como na oração e os mais lastimáveis acidentes não os perturbam”. É neste ponto que o humanismo de Louis Lallemant é questionado (numa discreta controvérsia que opôs Georges Bottereau a François Courel, editor do jesuíta em 1961).

 

Bibliog.: BOTTEREAU, Georges, “Louis Lallemant”, Dictionnaire de Spiritualité, Paris, Beauchesne, 1975; BREMOND, Henri, Histoire Littéraire du Sentiment Religieux, t. v, vol. 2:  L’École du Père Lallemant et la Tradition Mystique dans la Compagnie de Jésus (1.ª ed.: 1920), Grenoble, Jérôme Millon, 2006; CERTEAU, Michel de, Le Lieu de l’Autre. Histoire Religieuse et Mystique, Paris, Gallimard/Le Seuil, 2005, pp. 170-175; DESLANDRES; Dominique, Croire et Faire Croire, Paris, Fayard, 2003; Lallemant, L., Doctrine Spirituelle, nouvelle édition augmentée par D. Salin, Paris, Desclée de Brouwer, 2011.

 

Pierre Antoine Fabre

 

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