Tributar é a forma normal de os humanos tornarem as divindades propícias e de se posicionarem corretamente na pirâmide relacional. Para as divindades, o melhor, em atitude “serviçal”, de vassalagem, de adoração, de veneração generosa; para os humanos, o posto inferior, ditado por uma outra essência, falível, pecadora, limitada, carente de apoio, de ajuda, de socorro.
A história das grandes civilizações fala sempre em dois tributos. Um, para agradar, aplacar, ou propiciar quem manda (imperador, rei, chefe…) ou, então, para permitir que os seus empreendimentos se tornem possíveis (sejam eles materiais, militares, egocêntricos – envolvendo-o a ele e/ou ao seu grupo). Uma segunda vertente, mais de cariz religioso, aponta para que todos os deuses “precisam” de ser honrados, tributados, venerados para que se tornem propícios aos homens. A falta de tributo pode gerar ira divina. Deus que não seja honrado ou não colha a generosidade dos fiéis pode descarregar a sua ira sobre os humanos e isso gera desgraça. É nessa linha que se leem os panteões, os quais servem para adorar todos os deuses, por igual. Não adianta ter o deus dos ventos (eolo), se não está presente o deus da saúde; não adianta a proteção do deus da guerra, se não está também o deus do fogo.
A questão do tributo prende-se também com o cerimonial, ou seja, com o culto (isto é, conjunto de cerimónias). O tributo pode ser feito através da oração, de ofertas, de refeições sacrificais, de sacrifícios de expiação. No plano bíblico, o registo dos primeiros tributos a Deus surge na história de Caim e Abel, filhos de Adão: “… Caim apresentou ao Senhor uma oferta de produtos da terra e Abel ofereceu as primeiras e melhores crias do seu gado” (Gn 4, 3). Já no tempo dos antigos patriarcas, Abraão encontra-se com “Melquisedec, rei de Salém”, o qual “se apresentou com pão e vinho” (Gn 14, 18). Com a estruturação da vida política, social e religiosa de Israel, desenvolve-se um complexo sistema de ofertas e sacrifícios que se mantém após o regresso do exílio na Babilónia. Em certa medida, é este sistema unificado que, de algum modo, é reinterpretado por Jesus, quando afirma: “… deem a César o que é de César e a Deus o que é de Deus”.
Bibliog.: Constable, Giles, Monastic Tithes: From their Origins to the Twelfth Century, Cambridge, Cambridge University Press, 2008; GEMEREN, W. A. van, “Ofertas e sacrifícios nos tempos bíblicos”, in ELWELL, Walter (ed.), Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã, vol. 3, São Paulo, Vida Nova, 1990, pp. 43-49; Giblin, Charles Homer, “‘The Things of God’ in the Question Concerning Tribute to Caesar (Lk 20:25; Mk 12:17; Mt 22:21)”, The Catholic Biblical Quarterly, vol. 33, n.º 4, 1971, pp. 510-527.
José Paulo Leite de Abreu
Timóteo Cavaco